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‘Janis’ – Um vulcão, que parecia adormecido, para sempre, desperta no Flamengo

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Tempo estimado de leitura: 4 minutos

Que me perdoem os fãs da cantora, mas nunca me deixei encantar por JANIS JOPLIN!

Eufemismos servem para não ser preciso dizer, diretamente, algo indesejável, impublicável, grosseiro ou que possa não agradar a outrem. Na verdade, sem eufemismos, nunca gostei de JANIS JOPLIN.

E estou eu, cá, escrevendo uma crítica sobre um espetáculo teatral, cujo título é “JANIS” e, obviamente, gira em torno daquela que abalou o universo musical, em sua época e, tendo morrido, precocemente, aos 27 anos, de overdose, deixou uma legião de fãs e seguidores, os quais, até hoje, lhe têm carinho e lhe prestam fiel devoção, dentre os quais CAROL FAZU, idealizadora do projeto e intérprete única deste monólogo musical, em cartaz no Teatro OI Futuro Flamengo.

Mas por que, então, estou escrevendo? Escrevo, sim, e com muito prazer! Não sou crítico musical; não vou, portanto, falar da cantora. Minha “praia” é o TEATRO e é uma peça teatral que estou abordando, para dizer o quanto o espetáculo me agradou e como me surpreendi com o que me foi permitido ver em cena.

Ainda que, repito, não me atraísse a arte de JANIS, conhecia, muito vagamente, é verdade, sua obra e sabia dos detalhes mais divulgados de sua conturbada vida, culminando com sua trágica morte. Confesso que nunca havia pensado que a vida dessa cantora de “blues” pudesse render um bom espetáculo teatral, talvez por preguiça de pensar; mais por desinteresse mesmo.

De repente, comecei a ver, nas mídias sociais, chamadas para um espetáculo sobre JANIS JOPLIN. Interesse pouco, além da curiosidade e da obrigação do ofício de crítico e jurado de um Prêmio de TEATRO. Espetáculo dirigido por SÉRGIO MÓDENA: o interesse começou a surgir. Texto escrito por DIOGO LIBERANO: aumentou o interesse. Tudo interpretado por uma desconhecida, para mim: CAROL FAZU, cujo talento lamento, profundamente, não ter conhecido há mais tempo.

Não falarei sobre a vida e a obra de JANIS JOPLIN. Tudo está lá, no palco, à espera de quem precisa, e deve, principalmente as novas gerações, pós-JANIS, ficar sabendo sobre esse ícone, um verdadeiro mito…

Vamos, agora, ao que interessa e a que me proponho: falar do espetáculo teatral.

Comecemos pelo texto. Poderíamos considerar uma tarefa bem fácil pegar biografias da cantora e fazer, simplesmente, uma colagem, contudo não é bem isso o que contém o texto da peça. Aliás, não é apenas isso. É evidente que DIOGO LIBERANO não poderia partir para a ficção e inventar uma JANIS que não existiu. Ele teve de se alimentar dos fatos reais, que marcaram a vida da cantora, entretanto acrescentou, à receita do “mexido”, o seu tempero especial de dramaturgo e fez um ótimo trabalho de costura das várias partes selecionadas, passando-nos a ideia de uma sequência sem cortes, como se fosse uma vida contada em 80 minutos.

Não poderiam faltar pitadas de sua marca pessoal de grande dramaturgo, não tivesse ele, em sua bagagem profissional, quase 30 peças escritas e encenadas, muitas delas tendo-lhe rendido prêmios e indicações. O resultado foi muito bom.

Tenho a impressão de que SÉRGIO MÓDENA suou a camisa, para conter a energia descomunal de CAROL FAZU em cena. Creio, também, que seu “feeling” de diretor, tantas vezes premiado, por grandes trabalhos, foi capaz de fazer-lhe ver que CAROL parece não precisar muito de quem a dirija, quando encarna sua cantora preferida. De qualquer maneira, não posso omitir que é ótimo o trabalho de direção, que conduziu a trajetória de JANIS sem vitimizá-la e fazendo saltar aos olhos o seu empoderamento, pelo menos aparente, embora, no fundo, fora das luzes, se mostrasse tão fragilizada. Gostei muito das marcações, que não poderiam ser deixadas de lado, uma vez que se trata de TEATRO e é preciso gerar efeitos posturais e de ocupação territorial, no palco, que funcionem, do ponto de vista plástico.

E o que falar de CAROL FAZU? Ou gastar muitos parágrafos, ou resumir tudo em duas, três ou quatro palavras: FANTÁSTICA, FENÔMENO, VULCÃO, ÚNICA!!!

Nem uma coisa, nem outra. Ficarei no meio termo. CAROL não é só a voz de JANIS, sem tentar imitá-la. Que isso fique bem claro! CAROL é o corpo de JANIS, é a alma de JANIS. É JANIS em sua plenitude. Se fechamos os olhos, a imagem da cantora se forma na nossa mente; se os mantemos abertos, assusta-nos aquela presença física, a poucos metros de nós, dominando o palco, cabelos ao vento, gestos largos, interpretando cada verso das canções; não apenas cantar por cantar. Cantar, sentindo a emoção da letra e fazendo com que seu conteúdo chegue a cada espectador, passando por uma ponte que ela constrói, entre si e o público. Não há como ficar disperso um momento sequer, durante todo o espetáculo. Ela nos fisga, desde sua primeira aparição, e nos mantém cativos, até deixar o palco, no último “blackout”. Sua energia, física e interior, não conhece limites.

CAROL tem formação musical, tendo estudado música na Escola de Música de Brasília. E eu me pergunto – e não me perdoo – como, até hoje, eu não conhecia o talento dessa mulher? Como costumo postar, numa rede social, quando me encanto pelo trabalho de algum(a) artista, não posso deixar de registrar que estou “num relacionamento sério (seriíssimo) com CAROL FAZU”, que merece todo o meu respeito e aplauso.

JANIS, ou melhor, CAROL não canta “a capella”. É muito bem acompanhada por uma banda, formada por excelentes músicos; ANTÔNIO VAN AHN (teclado), ARTHUR MARTAU (guitarra), EDUARDO RORATO (bateria), GILSON FREITAS (saxofone) e MARCELO MÜLLER (contrabaixo).

Merecem destaque, ainda, no espetáculo, a ótima direção musical, de RICCO VIANA; a cenografia e os figurinos, de MARCELO MARQUES; a frenética e bem apropriada luz, de FERNANDA MANTOVANI e TIAGO MANTOVANI; o projeto de som, de BRANCO FERREIRA; a preparação vocal, de PATRÍCIA MAIA; e o visagismo, fundamental, de MÁRCIO MELLO.

“JANIS” é um projeto que há de marcar o ano teatral de 2017, no Rio de Janeiro, infelizmente, tão carente de bons musicais, neste primeiro semestre, com raras e honrosas exceções.

Dúvidas, críticas ou sugestões, envie para gilberto.bartholo@rioencena.com.

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