Típico exemplo de quem consegue enxergar perspectivas positivas onde todos veem apenas dor, Álamo Facó está de volta aos palcos com o monólogo “Mamãe”. Desta vez, para apenas duas apresentações na Mostra Gamboavista, no Galpão Gamboa: neste sábado (30/04) às 21h e no domingo (01/05), às 20h. Responsável pelo texto, pela direção (ao lado de César Augusto) e com participações em outros elementos, como cenário e figurino, ele relembra no espetáculo os 100 dias ao lado da mãe que se interpuseram entre o diagnóstico que apontou nela um tumor cerebral e a consequente morte, em 2010. Entretanto, ressalta ele em entrevista ao RIO ENCENA, o objetivo da montagem não é alardear drama diante da plateia, mas, sim, dividir uma experiência real (que diga-se de passagem, possui linhas ficcionais).
– Não fico só no fato em si, mas abro muitos assuntos. É um mosaico que criei sobre uma coisa triste que me motiva. Vai ter uma mensagem humana, mas sem ser piegas – destaca o ator carioca, que em julho viaja com a peça para São Paulo.
Aos 34 anos, Álamo reúne dezenas de trabalhos no cinema e no teatro, mas até mesmo pelo envolvimento pessoal, elege “Mamãe”, que vem sendo apresentado regularmente desde que estreou em novembro de 2015, como o preferido de sua carreira. Por ter vivido a situação de perto e ter construído a dramaturgia em cima disso, ele (que ora interpreta o filho, ora a mãe) cita o momento em que a progenitora mergulha de forma ininteligível em sua própria consciência como o mais difícil de se interpretar no palco. Essas e outras curiosidades sobre a peça, ele próprio comenta na entrevista abaixo:
Quando você teve aquele estalo de montar o espetáculo sobre um drama pessoal tão marcante?
Quando a ideia surgiu, minha mãe ainda era viva. Eu já comentava algumas coisas nesse sentido, que (essa história) poderia virar um livro… Aí comecei a ficar curioso. A consciência, esse lugar misterioso, subjetivo… Encontrei o (ator) Enrique Dias e falei: “Isso dá uma peça!”. Isso é meu lado roteirista, dramaturgo, vendo a consciência de uma pessoa entrando em coma, o que teatralmente, é algo instigante. O conhecimento e a memória se tornando uma coisa só. Já o Álamo como filho entra nessa história como quem quer passar uma mensagem, quem viveu aquilo de perto. É como uma escavação do passado, mas com pontos de ficção.
Mas apesar da carga dramática, você procura fugir do lugar comum…
É como um filme, que pode falar sobre vários assuntos, sem se prender a um único gênero. Cada vez mais temos visto isso. Tem bastante humor, ficção, histórias que vivemos mesmo… A peça fala de uso de drogas, de acampar pelo Brasil , de relacionamento aberto, sobre como sociedade vê os relacionamentos abertos. Por exemplo, um casal já ao fim de um casamento de 20 anos. Não fico naquela energia de acordar e pensar: “Caramba, lá vou eu fazer aquilo novamente”. Não fico só fato em si, mas abro muitos assuntos. E esse é meu tipo de trabalho preferido, de edição. Se você me fala algo aqui, eu posso pôr na peça amanhã. É um mosaico que criei sobre uma coisa triste que me motiva. Vai ter uma mensagem humana, mas sem ser piegas.
E esse é seu espetáculo preferido?
Eu fiz “Pterodátilo” (2010), com o Marco Nanini. Foi marcante também. Mas esse monólogo carrega uma mensagem. É como aquela frase em inglês: “Message in a bottle” (“Mensagem numa garrafa”). Parece que eu jogo uma garrafa para plateia, e cada um encontra uma mensagem. Talvez sejam várias garrafas (risos).
E há alguma cena mais difícil de fazer?
A cena que mais gosto é a da expansão da consciência dela (da mãe). Essa cena vai para o pensar impensável, aquela coisa de lidar com nossa noção de mundo de uma forma diferente. Ela fala algumas frases desconexas (Álamo começa a citar falas da peça). Acho a cena mais desafiadora. Ela cita (o antigo rei da Inglaterra) Henrique V, vai para o fundo do mar… (risos)
E você procurou ficar por dentro de tudo, não é? Texto, direção, cenário, iluminação…
É uma peça que eu já fazia na casa de amigos. Escrevi o texto já escolhendo a trilha sonora, para dar uma animada. Pensava: “Que música tem a ver com essa cena?”. E escolhia no Youtube mesmo… O cenário foi a mesma coisa, eu já fazia com cadeiras de acrílico, liquidificador… Procurei artistas que eu já conehcia para trabalhar comigo. Como a Bia Junqueira, que assina esse cenário, ela traz o piso e as persianas e, claro, o seu olhar. O Rodrigo (Marçal) é meu parceiro na trilha sonora. Ele me deixa mais seguro sobre o que estou pensando. E a Lan Lan foi a única com quem não havia trabalhado ainda, mas já a conhecia e já queria trabalhar com ela.
Tem outros planos a curto prazo?
Estou com vários filmes que saemainda esse ano: “Sob Pressão”, do Andrucha Waddington; “BR-716”, do Domingos de Oliveira, “Maresia”, do Marcos Guttmann; “Longe Demais, Ainda Não é Suficiente”, do Ernesto Solis; e “Amores Modernos”, do Gustavo Moretszon. E também uma série para TV, chamada “Essa Noite Encarnei no seu corpinho”, do Paulo Halm. Provavelmente sairá no Multishow.