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Luis Lobianco estreia peça sobre trans assassinada e lamenta preconceito no Brasil: ‘Regredimos absurdamente’

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Tempo estimado de leitura: 4 minutos
Lobianco não faz o papel de Gisberta, mas sim interpreta textos que sobre a história dela Foto: Elisa Mendes/Divulvação
Lobianco não faz o papel de Gisberta, mas sim interpreta textos que sobre a história dela Foto: Elisa Mendes/Divulvação

O ator Luis Lobianco sobe ao palco do CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) no dia 1º de março, às 20h, para iniciar a temporada de estreia do espetáculo “Gisberta”. Sozinho no palco e sob direção de Renato Carrera, ele conta diversas passagens da história de Gisberta Salce Júnior, brasileira trans assassinada de maneira cruel no ano de 2006 em Portugal, onde viveu seus últimos anos. No entanto, embora a barbaridade tenha acontecido bem longe daqui, o espetáculo – escrito por Rafael Souza-Ribeiro a partir de depoimentos de familiares da vítima, do processo judicial e de visita ao local do óbito – pode servir de alerta no Brasil que, como reforçou Lobianco em conversa com o RIO ENCENA, é referência quando o assunto é preconceito contra gays e homossexuais.

– Regredimos absurdamente! Ao contrário de Portugal, hoje vivemos a realidade do discurso de ódio contra minorias que ganha cada vez mais espaço – lamenta o versátil ator, que além de estar em cartaz também com a peça “Portátil”, faz parte ainda dos elencos do canal do Youtube Porta dos Fundos, do filme “TOC: Transtornada Obsessiva Compulsiva” e da série “Valentins”, a ser lançada ainda neste ano pelo canal Gloob.

O tom de lamentação de Lobianco, aliás, faz coro com os números. Segundo pesquisa realizada pela ONG (organização não governamental) Transgender Europe (TGEU), o Brasil é o país onde mais se mata transexuais e travestis, já que cabe a ele a considerável e vergonhosa fatia de 42% dos 295 casos de assassinatos de pessoas trans registrados ao redor do mundo em 2015.

Para começar a mudar essa realidade, Lobianco acredita que um passo importante seria uma presença mais maciça de representantes da comunidade trans no mercado de trabalho. Além disso, ele acha que o tema poderia ser mais abordado nos teatros, apesar de já ver com bons olhos o fato de “Gisberta” estar se somando a outra peça que também chama a atenção para as questões trans: “Uma Flor de Dama”, com o ator Silvero Pereira. Confira essas e outras ideias do ator na entrevista abaixo:

A peça é uma denúncia contra o preconceito? É possível classificá-la assim?
Pode ser, mas prefiro pensar que serve para tomarmos conhecimento do quanto a transfobia mata e do quanto faz parte da nossa sociedade. Principalmente no Brasil, onde ignoramos essa verdade. E por isso, somos o país que mais mata transexuais. Gisberta morava em Portugal, e lá esse caso até hoje tem repercussão grande. Ela virou ícone contra a transfobia, e através de sua figura, grupos ativistas conseguiram mudanças nas leis por mais segurança e dignidade. Na peça, principalmente, tratamos de humanidade. Obviamente, estamos falando de um assassinato, mas também de empatia, de desejos. Ela tinha desejos artísticos, talento, foi para Europa em busca de sonhos.

Lobianco está em cartaz também com a peça "Portátil" Foto: Divulgação
Lobianco está em cartaz também com a peça “Portátil” Foto: Divulgação

Você acredita que o Brasil regrediu na questão do preconceito ao universo trans nos últimos anos?
Regredimos absurdamente! Ao contrário de Portugal, hoje vivemos a realidade do discurso de ódio contra minorias que ganha cada vez mais espaço. Inclusive na política! E quando setores da sociedade replicam esses discursos e elegem pessoas que se promovem  a partir disso, fica mais perigoso. Quando alguém fala que o filho é gay porque não tomou porrada em casa, e pessoas acreditam nisso, muitos acabam apanhando e sofrendo violências até a morte. Estamos caminhando para um abismo de ódio e intolerância, o que é assustador. Quase não reconheço mais o Brasil, que é o país do Carnaval, das diferenças. É meio sombrio! Portugal vive um momento de abertura econômica, para novas possibilidades. Claro que é um país menor em todos os sentidos, território, população… Mas lá as pessoas estão mais dispostas a conversar e aceitar as diferenças.

Você está entrando em cartaz agora com “Gisberta”, o Silvero Pereira está saindo com “Uma Flor de Dama”, que trata de temática semelhante. Você acha que são poucos os espetáculos que abordam esse tema no teatro?
Acho que sim. Mas ao mesmo tempo, acho que nunca falamos tanto sobre preconceito contra trans, contra gays como agora. Acho que já é um avanço. O tema do momento é debater identidades, as pessoas estão exigindo suas identidades. Acho que não apenas precisamos falar sobre isso, como também as pessoas trans precisam estar no mercado trabalhando. Precisam estar presentes nas artes também. A pessoa trans precisa ser chamada para trabalhar. Acho que esse é um caminho de evolução

Dá para dizer que “Gisberta” é um espetáculo pesado? Até pela história de vida dura e o fim trágico que ela teve.
Acho que não tem como suavizar. O que ela viveu é importante que as pessoas saibam para tomarmos consciência, refletir, se indignar… Por outro lado, ela era especial, amada pela família, pelos amigos. Por onde passou, marcou sua personalidade. Como falei, tem muita humanidade nessa peça, tem poesia, pois falamos dos desejos do artista. Estamos fazendo teatro, que é o espaço do lúdico. Eu trabalho com cabaré há cinco anos, ela também viveu isso. Foi o que achei como um ponto em comum. É importante que a gente conte o que aconteceu, o crime que foi horroroso, mas também tem o outro lado.

Você conhece ou já conheceu uma “Gisberta”?
Algumas. Tive a sorte de conhecer “Gisbertas” que conseguiram, nesse momento atual, conquistar seus sonhos, hoje estão no mercado de trabalho. Estas são privilegiadas em relação a outras que não tiveram tantas oportunidades. Moro na Lapa e aqui convivemos com diferenças o tempo todo, o que é enriquecedor. Toda sexta, faço o espetáculo “Buraco da Lacraia” (que volta com a terceira temporada em março no bar de mesmo nome), e recebemos o público trans, LGBT. Faço também o “Rival Rebolado” (volta em abril no Teatro Rival), idealização minha com a Leandra Leal e o Alê Youssef, e nós resgatamos a arte da noite, das drag queens… E o Rival tem pessoas trans no seu quadro de funcionários. Todo mundo ganha com isso. As pessoas precisam desse espaço.

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