Em cartaz no Teatro Municipal Café Pequeno, no Leblon, “O Hétero”, que tem direção de Alice Steinbruck, é monólogo divertido sobre a jornada de um ator para conquistar seu lugar no Rio de Janeiro.
O texto, assinado pelo próprio ator Zé Wendell, é uma preciosidade que remete à super tradição do repente nordestino, repleto de rimas, expressões idiomáticas cariocas e paraibanas, piadas internas, lógica e métrica próprias, enfim… para mim o ponto alto do espetáculo, não só por sua qualidade mas pela originalidade no quadro teatral da cidade. Outro aspecto positivo é que a montagem não força a sua percepção: a gente demora para notar a poesia do texto, e isso acentua a surpresa!
O cenário traduz com simplicidade a ideia passada pela peça de que vida e arte se misturam. O fundo do palco abriga traços, que continuam no chão, que lembram a luz de um refletor teatral. Com um protagonista que direciona sua vida para o sonho de ser ator, me pareceu um ótimo simbolismo.
O figurino carrega um forte caráter urbano contemporâneo, o que é bom para não se perder em estereótipos, sobretudo nordestinos, principalmente diante de um texto que abraça tradições típicas da região.
Zé Wendell concentra energia e comicidade próprias, personificando um lugar de encontro entre nordeste e Rio de Janeiro que é muito especial. A partitura física constante e marcada dilui esse efeito, inserindo ações “teatrais”.
Esta opção por gestos e movimentos marcando as falas desvia a atenção do traço regional que caracteriza a peça, presente na forma e no conteúdo (enredo) do texto, e visível também na atuação de Zé Wendell. Por outro lado, ela funciona como um importante catalisador para questões sociais e políticas que a peça aborda, além de ajudar a camuflar a força do texto, que de outro modo poderia ficar didático demais.
Um abraço e até domingo que vem!
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