Uma vez escutei que o Carnaval e o teatro andavam juntos, porque nasceram juntos. São muitas as histórias que unem suas origens, e a que mais gosto é a que narra o surgimento do teatro nas festividades dionisíacas em Atenas, onde atores representavam o deus grego da fertilidade, alegria, natureza, muito associado ao Carnaval. Até hoje, neste período do ano, suspendemos o nosso eu comum para sermos livres e performarmos a festa pagã cristianizada. Fantasiados, vivemos o nosso momento ator; por trás de máscaras, tomamos coragem e beijamos; durante ao menos cinco dias, suspendemos a desgraça coletiva brasileira para somente viver.
Quando penso no Carnaval no Rio de Janeiro, logo vem à cabeça os blocos e Escolas de Samba. Ambos envolvem toda uma gama de profissionais que vivem da grande festa, e a maioria é artista. Seja na representação, na dança, na percussão ou na construção dos carros alegóricos, fantasias e alegorias, o Carnaval é uma grande festa teatral que a mídia chama de “maior espetáculo da terra”.
A minha experiência carnavalesca é muito carioca. Embora já tenha frequentado outros carnavais que o país promove, eu prefiro me acabar nos blocos de rua do Centro e Zona Norte do Rio, sou daquelas que interpreta quando se fantasia e assim vou guardando bons momentos no baú da minha memória.
Entretanto, este ano não vai ter Carnaval. Com mais de 230 mil mortos pelo Covid-19 e a cidade do Rio de Janeiro batendo recorde nacional de vítimas, não tem como celebrar uma festa de culto à Vida se o ar que respiramos é de Morte. Sabemos que sua ausência traz um vazio e certa confusão, porque, afinal, o “ano só começa depois do Carnaval!”, mas nos colocarmos em risco em nome do vuco-vuco dionisíaco é falta de amor próprio e falta de empatia à vida do próximo. Então, esse ano, vamos nos recolher. Não é o momento de botar nosso bloco na rua.
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