Mesmo aos 61 anos de idade e 50 de carreira, nunca é tarde para se viver uma nova experiência profissional. Diogo Vilela que o diga! No último dia 24, o experiente ator se apresentou pela primeira vez num espetáculo transmitido ao vivo pela Internet. Com as salas já liberadas pela prefeitura, mas ainda passando por adaptações para receber o público em meio à pandemia de Covid-19, o Teatro Claro Rio convidou Diogo para uma apresentação online de “Cauby, uma Paixão”, adaptação de “Cauby, Cauby”, solo musical com o qual o artista se apresenta desde 2006 homenageando o cantor Cauby Peixoto (1931-2016). E o balanço desta empreitada virtual, segundo o próprio, é positivo.
A começar pelo número expressivo de pessoas assistindo através de smartphones, tablets e afins: cerca de 15 mil, segundo Diogo. Além disso, o ator se emocionou ao se convencer, como explicou em entrevista para o RIO ENCENA, que é possível o teatro estar presente também na rede virtual, sem deixar de lado sua magia presencial.
— Eram duas comunicações se cruzando, na verdade, uma comunicação do teatro com o futuro. E acredito que seja algo que vá ser benéfico, com pessoas assistindo presencialmente e outras, online. Acho que essa tecnologia modifica o código da arte, esta arte que precisa sobreviver — destaca o ator, que está no ar atualmente na TV com o humorístico “Zorra” (TV Globo), gravando suas cenas de maneira remota, também com o recurso digital.
Já em contrapartida à possibilidade de um “teatro virtual” no futuro que agrada a Diogo, o incomoda a visão, que ele chama de “equivocada” que muitas pessoas têm do teatro. Em tempos de YouTubers e Digital Influencers, o ator desabafou afirmando que palco não é espaço para se inflar egos.
— A Internet é o lugar do ego, e lá, dão força para você ser incrível, para levantar a autoestima, e eu acho interessante isto… Mas não tem nada a ver com arte… Arte não é ego. É o desenvolvimento de um trabalho artístico, que vem de um tempo — ressalta o ator, com a propriedade de quem trabalha com teatro há meio século, período no qual trabalhou em dezenas de peças, as quais ele prefere nem contar.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Como foi sua primeira experiência com teatro transmitido online? Teve algum grande obstáculo ou tirou de letra?
Não tirei de letra porque fiquei bastante emocionado. Me preparei por um mês e meio, trabalhando com as câmeras, que eram três. Foi tudo muito surpreendente, e uma conquista para mim. Fiquei feliz por ver o teatro, o homem e a arte se modificando. Estava fazendo a peça e, ao mesmo, tempo percebendo esta evolução. Eram duas comunicações se cruzando, na verdade, uma comunicação do teatro com o futuro. E acredito que seja algo que vá ser benéfico, com pessoas assistindo presencialmente e outras, online. Acho que essa tecnologia modifica o código da arte, esta arte que precisa sobreviver. Infelizmente, estamos vendo isto acontecer de forma dolorida, por causa da pandemia. Mas que tenhamos no futuro pessoas que frequentem teatro, ou que assista online quem mora em outros lugares ou até os idosos, que têm mais dificuldade de locomoção… Mas acho, sim, que isto possa vir a acontecer.
Então você vê essa coisa de peça transmitida pela Internet, com plateia virtual, com bons olhos?
Sim, acredito que veio para ficar. Assim como futebol, que tem o ao vivo e o televisionado. Na verdade, ninguém entende como o ator sobrevive. Entendem que o ator não precisa de mais nada porque já está no palco. Esta é uma visão equivocada, principalmente no Brasil, onde nos julgam. Na sociedade em que a gente vive, o teatro está sendo visto de forma equivocada. O teatro é demonizado, pessoas têm uma visão equivocada. Confundem com auto exposição, acho que regrediu muito a capacidade de percepção da arte neste sentido. A Internet é o lugar do ego, e lá, dão força para você ser incrível, para levantar a autoestima, e eu acho interessante isto… Mas não tem nada a ver com arte. Houve uma pandemia que meio que humanizou esta dor, colegas meus fizeram também este movimento de resistência para mostrar que teatro não é palanque para mostrar a si próprio, é algo muito mais rico. Fiz isto (sessão online) por amor ao teatro e prazer, e percebi que pode seguir online e conquistar seu espaço quando acabar esta reclusão. Muitos querem que o teatro acabe, dizem que não funciona mais, mas teatro é uma arte necessária. Gostei muito quando vi o pessoal da técnica, que eram os únicos na plateia, emocionado. Foi bonito! E assistindo pela Internet foram 15 mil. Arte não é ego. É o desenvolvimento de um trabalho artístico, que vem de um tempo.
E o fato de a plateia estar vazia? Causou muito estranhamento?
Sempre tive sucesso nas minhas peças, mas também já fiz para poucas pessoas. E foi super legal! É aí que entra o ego que comentei. Não é necessário o aplauso quantitativo. O ator quer ser aplaudido, mas não desta forma. Já estive em teatro que o pessoal da faxina parava o serviço e ficava assistindo. E eu adorava! Eu já sabia que não ia ter ninguém, o que é diferente de se estar em cartaz, e a plateia estar vazia. Mas fiz para quem estava ali, e eles se emocionaram. Foi lindo, e eu ainda não me recuperei.
E teatro presencial? Já tem ideia de quando e com qual trabalho vai voltar?
Recebemos vários convites e estamos analisando. Mas ainda estou me recuperando desta última apresentação, porque fiquei muito emocionado (risos). Temos muitas coisas em vista, mas só pretendo voltar quando puder mesmo. O teatro é uma arte cara, nós pagamos diariamente, então, imagina você saber que só vai ter metade da bilheteria disponível? Não dá! A não ser que apareça uma alma boa para patrocinar. Quando acabar pandemia, vai rolar.
Em relação ao público, qual sua expectativa para a volta do público aos teatros?
O teatro passa por crises há anos, desde que me entendo por gente. A gente vai sempre procurar pelo púbico, e ele sempre vai aparecer. Claro que às vezes diminui, dependendo do momento. Mas acho que depois de ter dado falta, por conta da pandemia, acho que o público vai valorizar mais o teatro, entender que é importante também.
Por tudo o que você comentou até agora, se diria então um otimista quanto ao futuro do teatro?
O teatro é o livro falado. E acho que sempre vou ser otimista, o teatro sempre vai existir, e será melhor ainda quando voltar. Neste vazio humano que a gente está vivendo, acho que vai ter sempre alguém querendo buscar mais conteúdo. O teatro é uma zona livre, que pode ter vários aspectos, várias abrangências.
Por fim, como foi a experiência no “Zorra”?
Está sendo muito diferente também porque gravo remotamente. Tenho meu irmão, que é produtor, me ajuda com a câmera, a equipe do programa fica toda conectada… É algo muito criativo, mas interessante e tenso, porque a gente quer sempre fazer o melhor possível. Mas está dando certíssimo.