O texto de hoje é uma provocação: está na hora de reabrir as salas de teatro e cinema do Rio de Janeiro? Estamos no sexto mês oficial de pandemia no Brasil, num cenário ainda muito difícil e desesperançoso com mais de 130 mil mortes no país, 16 mil na cidade do Rio de Janeiro e quase 1 milhão no mundo. Com praias lotadas e aglomerações de todos os tipos, o carioca está retomando sua rotina. Sem querer lançar julgamentos, mas me perguntando sobre a autorresponsabilidade e a responsabilidade social de cada um, encaro a naturalização das aglomerações como uma consequência direta do desgoverno que vivemos em nível municipal, estadual e federal.
Neste sentido, quando olhamos a questão das salas de teatro e cinema, precisamos considerar o lobby que as grandes empresas do entretenimento fazem sobre a administração pública. Claro que o custo para a manutenção dos negócios da área sem geração de receita está complicando a vida dos gestores, mas limitar a discussão apenas ao aspecto econômico é bastante leviano e desumano. Além disso, tirando essas megacompanhias do entretenimento com acionistas e salas ultradigitais de ponta, qual produtor cultural hoje teria condições de promover um espetáculo/exibição presencial na cidade cumprindo todas as exigências necessárias, assegurando a saúde do público, a dos artistas e da equipe técnica?
Quando focamos nos artistas e produtores independentes, a inviabilidade aumenta ainda mais, como apontou o ator, escritor e produtor Rodrigo França: “Existem produções teatrais com grandes suportes e recursos financeiros e outras que são frutos da resistência. Então, que teatro é esse que estamos discutindo segurança? Acredito que a decisão da retomada ou não parte também dessas análises. Eu sou produtor e sou responsável também pela integridade física dos meus profissionais. Que teatro é esse que vou expor os meus artistas e técnicos? Mesmo num momento em que precisamos muito trabalhar e sem a mobilização do poder público para preencher lacunas e reparar perdas no setor cultural, reabrir as salas seria um grande risco a integridade de todos.”
A presidenta interina da Associação Preta de Teatro e Artes do Rio de Janeiro, Damiana Inês, declarou que “o teatro, além de outras coisas, é sobre tomada de consciência. Não faz sentido pra nós os teatros abrirem agora. Apesar do desejo e necessidade e dos possíveis protocolos de segurança que seriam tomadas, somos contra. E pela proximidade das eleições, começarão a subnotificar os casos e abafar o discurso do isolamento social. Ainda vem uma segunda onda de contágio alto, segundo pesquisas. Achamos totalmente irresponsável. Infelizmente”.
Frente a esse cenário e de acordo com os planos de reabertura da prefeitura do Rio, caberá a cada diretor/produtor e proprietário de salas avaliar a possibilidade de reabrir cumprindo as normas sanitárias estabelecidas, ou seja, o poder público joga para eles o dilema ético do “abrir ou não abrir, eis a questão”. Lamentável!
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