Por questões de traumas e saúde mental, resolvi me abdicar esta semana de colocar aqui o número de vidas que já perdemos desde março de 2020 para a Covid-19. Também não coloco o número de vítimas que, diariamente, padecem na miséria e fome. Esta semana, você não vai encontrar na minha coluna o número de pessoas que nunca tiveram chance de ter acesso ao estudo. São todos números importantes. São todos números fatais. Afinal de contas, o que parece ser importante esta semana é aprender ciências na CPI da Covid e que o Basil vai sediar a Copa América. É isso mesmo?
Como disse recentemente meu amigo Victor, “o Brasil não merecia isso, não merecia.” Concordo com você, Victor. O Brasil, realmente, não merecia isso. Enquanto isso, aqui estou eu, resistindo mais um domingo falando sobre o que
alguns poucos de nós brasileiros ainda estão fazendo com gosto: arte. Esta semana, assisti à peça “Luiz Gama – Uma voz pela liberdade”, que está em cartaz no Teatro PetraGold, com apresentações presenciais e online.
Há algumas poucas semanas, assisti e escrevi aqui na coluna, a história de sua mãe, Luiza Mahin, e esta semana tive a oportunidade de saber um pouco mais sobre quem foi Luiz Gama. Não é uma história nova, mas é uma história real e necessária.
Ricardo Torres assina não só a direção como a cenografia e o figurino. Duas cadeiras, uma pequena mesa, um tapete, indumentária escura, uma direção clara, que dá valor ao tom narrativo da dramaturgia. Uma boa direção é fácil de destacar, principalmente, quando ela não entra na frente do que esta sendo contado. E Ricardo Torres faz um bom trabalho deixando essa história aparecer.
É bonito de escutar a poesia que nos remete à obra do Luiz Gama nessa peça. Deo Garcez vive Luiz Gama, esse ex-escravo, poeta, jornalista, primeira voz negra da literatura brasileira, abolicionista, o maior advogado de pessoas escravizadas do Brasil. É de Deo Garcez também a linda dramaturgia poética, reflexiva, instrutiva e verdadeira. Não podemos esquecer que é de Luiz Gama “o único relato direto de um escravo sobre sua própria condição”.
Soraia Arnoni se entrega a tantos personagens no palco, de maneira tão talentosa e tocante, que é uma delícia vê-la em cena nos guiando através dessa saga. Pontuada ainda por pequenas melodias de piano que compõem a atmosfera
da peça, “Luiz Gama – Uma voz pela liberdade” é uma bela dramatização de uma importante figura histórica do Brasil.
“A liberdade e a igualdade não são privilégios e, sim, direitos de qualquer pessoa.” Essa maravilhosa frase se encontra no final da peça, e muito, propositalmente, ainda é repetida, creio que para ajudar-nos a lembrar da situação pandêmica que nos encontramos e de tantas desigualdades que vemos todos os dias nos noticiários.
Um aceno de mão efusivo e até a próxima semana.
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