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‘Castelo de cartas frágil que agora caiu”: após um ano de pandemia, artistas avaliam impactos no teatro e projetam futuro incerto

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Tempo estimado de leitura: 6 minutos

Há exatamente um ano o estado de pandemia era decretado no Brasil (Montagem com imagem reproduzida da Internet)

Há exatamente um ano, num 13 de março, o então governador Wilson Witzel fazia uma transmissão ao vivo pela Internet determinando a paralisação de diversos setores, inclusive da cultura, pelo período inicial de 15 dias, por conta do novo coronavírus, que, aquela altura, já avançava preocupantemente pelo estado do Rio de Janeiro. E como se sabe, esta quinzena inicial foi sendo prorrogada até que se chegasse a um ano inteiro de impactos no cotidiano de todos e registros de números assustadores – com uma media diária acima de 2 mil mortes, o Brasil chegou a 11.205.972 casos e 270.917 óbitos por Covid-19.

Diante deste alto índice de propagação que jamais regrediu consideravelmente, a retomada do circuito teatral da capital fluminense – autorizada pela prefeitura em setembro passado – também nunca chegou a engrenar, com algumas poucas salas reabrindo suas portas para receber o público novamente. Mas quando será que vai engrenar?

O futuro incerto para o teatro foi apenas um dos temas abordados por quem vive dele em depoimentos enviados a pedido do RIO ENCENA para este emblemático 13 de março de 2021. Representantes da classe artística teatral falaram ainda sobre a evolução do teatro online, o zelo pela vida, a importância da Lei Aldir Blanc para socorro a profissionais que tiveram suas atividades paralisadas pela pandemia e criticaram a política pública do pais voltara para a cultura. Confira abaixo:

(Divulgação)

Kadu Garcia – Ator e professor de teatro
“Este período que ainda estamos vivendo é muito triste e violento – e terrível para o teatro. Pensar uma cidade sem teatros abertos, sem a realização dos encontros que ele proporciona, é de muita tristeza. Curioso como isso dialoga com o mote do nosso espetáculo, “Procópio”. Naturalmente, o fechamento dos teatros pela pandemia afetou a vida de todos os profissionais das artes cênicas pelo impedimento do trabalho e da sobrevivência… O orçamento destes profissionais que vivem de teatro foi afetado com muita força, estão todos fazendo a famosa “rebolada” para tentar encontrar meios de sobreviver. Então, a Lei Aldir Blanc é de profunda importância porque veio proporcionar este tempo de sobrevida aos artistas. E é provável que, no nosso meio, tenha havido pessoas desistindo da profissão, porque a impossibilidade de trabalho e ausência da entrada de dinheiro naturalmente afeta qualquer pessoa; é uma experiência de sofrimento emocional muito intensa”.

(Divulgação)

Helena Marques – Integrante da Cia. Dobra e diretora
“É sim, muito ruim a interrupção das ações culturais. Para o setor, para a população, para o país, já que a cultura é um dos setores que mais movimenta a economia. Por outro lado, estamos vendo, todos os dias, pessoas morrendo por conta da doença. Então, é necessário que os teatros estejam fechados para que não contribuam para a piora da pandemia. Quando estivermos vacinados, e houver uma diminuição expressiva no número de casos, as salas voltarão, certamente! O teatro online foi a forma que os artistas encontraram de continuar existindo neste momento, mas ele não vai acabar com o teatro como sempre conhecemos. O online veio para ficar, mas será para somar, para criar outras formas de fazer arte, e não para substituir. O teatro sempre resiste! As esferas do poder público não só poderiam apoiar a classe artística, como deveriam. É papel dos municípios, estados e país criar mecanismos de proteção à população e ao setor cultural, está na constituição brasileira. Estamos falando da sobrevivência de pessoas que vivem da economia da cultura, já que foi um dos setores mais impactados pela pandemia, e as esferas públicas devem encontrar esses mecanismos. Um dos exemplos disso é a Lei Aldir Blanc, que foi fundamental para o setor”.

(Divulgação)

Laura Nielsen – Atriz
“Este ano de fechamento dos teatros, por conta da pandemia, foi absolutamente devastador. Durante boa parte da pandemia, artistas, técnicos e profissionais ligados à cadeia de produção cultural ficaram sem possibilidade de trabalhar. Os estragos foram maiores do que eu esperava. Muita gente com dívidas imensas acumuladas e sem perspectiva de retorno às atividades, o que gera angústia e depressão. Muitos espaços culturais já lutavam para se manterem abertos e, após esse período, temo que não consigam mais voltar a funcionar. A Lei Aldir Blanc está tendo grande importância neste momento, está movimentando a classe artística e possibilitando a realização de trabalhos artísticos online. Mas, infelizmente, ela tem um caráter pontual. Os editais contemplaram projetos específicos que já se encerram em abril. E depois disto? Não vejo nenhum planejamento de nenhuma esfera do poder público com relação a situação da cultura, e isso é muito grave e preocupante”.

(Divulgação)

Luiz Antônio Fortes – Diretor e integrante da Cia OmondÉ
“Não podemos facilitar para o vírus… Sou otimista, mas precisamos, muitas vezes, dar dois passos para trás, para poder avançar, e acho que estamos nesse momento. Os estragos foram muitos , a classe teatral ficou desamparada durante todo ano de 2020 e no início deste ano. Várias produções foram contempladas pela Lei Aldir Blanc, mas, com um tempo curtíssimo para colocar as produções em cartaz.  Ao longo destes anos vi muitos amigos desistirem da carreira do teatro, porque fazer teatro no Brasil é para poucos. E ficou mais claro nesta pandemia como a classe artística teatral está desamparada pelo sistema.  Lembro que em Março do ano passado pensei que ficaríamos fechados durante três meses, depois foram nove, e estamos há um ano nessa loucura ! Muitos teatros estão se desdobrando para continuar funcionando , “tentando se virar nos trinta”. Deveria ter uma nova leva para o segundo semestre do edital emergencial. Acho que assim, poderíamos evitar que mais espaços fechassem as portas ou ficassem num estado de abandono total”.

(Alan Chaves/ Divulgação)

Joana Marinho – Atriz, dramaturga e diretor
“Agora que estamos completando um ano com os teatros fechados, percebo que, no início, achávamos que poderíamos aguardar que tudo se normalizasse. Depois do quarto mês, percebemos como era necessário reinventar a nossa arte. O teatro sempre foi e será uma arte que precisa do espectador, mas descobrimos que podemos atingir as pessoas em suas casas. Desta maneira, muitos grupos e companhias começaram a reinventar o teatro, a criar linguagens possíveis com as novas mídias disponíveis. Estou finalizando a gravação do espetáculo “Constância”, que estreou em 2019 e foi paralisado com a pandemia. Começamos uma pesquisa de como incluir a linguagem do cinema dentro da linguagem do teatro. Essa é uma pesquisa muito bacana, apesar da motivação ser muito triste, o fruto de toda essa impossibilidade acaba sendo mais uma vitória para os artistas, que conseguiram se reinventar mais uma vez. Num momento de desespero, a arte tem um grande papel de trazer conforto, de mostrar para as pessoas que existe, sim, um problema, mas que ele pode ser superado e precisa ser debatido. A arte do teatro sobrevivendo, ainda vai tirar muitos bons frutos”.

(Lucio Luna/Divulgação)

Bruno Paiva – Ator e produtor
“Infelizmente, com o nosso atual cenário político, tudo me leva a crer que ainda veremos muitos estragos. É triste assistir ao nosso país afundando, nas mãos de líderes tão despreparados e nada empáticos com nosso atual momento. Muitos foram obrigados a procurar outras formas de sustento, pois nosso setor, a meu ver, juntamente com os produtores de festas e eventos, é o mais prejudicado em relação à impossibilidade de trabalhar, porque a arte do teatro, em sua essência, requer contato físico, aglomeração e a presença. Mas, ao mesmo tempo, somos a arte da resistência e da reinvenção. Novas formas de se fazer teatro também surgiram em meio a todo esse caos que vivemos atualmente. Precisamos viver uma pandemia para que uma grande injeção de verba no setor cultural fosse realizada. Porque o fundo de cultural não é utilizado regularmente? Ampliaria as possibilidade de trabalho de artistas que não são midiáticos, mas possuem em seus trabalhos uma potência pouco valorizada e que carece de oportunidades como esta, criada pela Lei Aldir Blanc”.

(Divulgação)

Artur Luanda Ribeiro – Diretor, ator e fundador da Cia Dos à Deux
“Em função das medidas sanitárias, concordo com a decisão de fechamento dos teatros. Porém, acho que em nenhum momento houve uma troca entre os centros culturais e teatros com artistas que já estavam programados. Estamos todos em banho-maria, e esta falta de diálogo me causa um pouco de espanto. Não tenho ideia de como será a nova programação do Paes para a cidade. Estamos aguardando para ver o tamanho do estrago. Acho que mais do que desistir, muitos artistas perderam as forças. Diante do panorama da pandemia – além da falta total de incentivo, editais, espaços – acho que muita gente que se pergunta ‘como é possível viver de teatro?' Já era complicado antes da pandemia e agora muito mais. Estamos nesse momento em que não se sabe nada, não se sabe quando os espaços vão reabrir. As formas híbridas têm sido muito mais uma iniciativa de cada artista, já que poucos são os espaços e editais – como o da Lei Aldir Blanc. Mas e depois? Já tem um tempo que as esferas públicas não estão ajudando a classe. São iniciativas, lógico, por via pública, por conta da Lei Rouanet, de centro culturais ligados ao Banco do Brasil, CAIXA etc.. Mas acho que o que falta mesmo é uma política real. Temos que nos juntar e, para as próximas eleições, precisamos montar um manifesto que vire lei, que dê um respaldo maior para a nossa classe. Não temos nada que nos proteja socialmente. É como um castelo de cartas que estava frágil e agora caiu”.

(Divulgação)

Ricardo Santos – Diretor
“É grave, já que estávamos com as salas de teatro sucateadas, desassistidas pelo governo. Não acredito que encontraremos ao final da pandemia salas em boas condições de receber o público e os profissionais do teatro. Sem um planejamento consistente e vontade política, será difícil a retomada . Fui testemunha de muita desistência, tanto de profissionais, bem como de espaços alternativos que compunham o cenário cultural. Muitos não sobreviveram e talvez não voltem a reabrir. A cultura em todas as suas frentes está abandonada pelo poder público desde antes da pandemia, não vejo, no momento, interesse público no investimento à arte e à cultura”.

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