No dia 02 de junho, a prefeitura divulgou o seu plano de reabertura econômica para o Rio de Janeiro, que apontava o veto a qualquer tipo de apresentação teatral (exceto as feitas de casa, claro) nas duas primeiras fases – a duração de cada uma é de 15 dias. Já nesta quinta-feira (02), teve início a terceira etapa, que – mesmo com a curva da pandemia do novo coronavírus ainda fora de um quadro decrescente – fala em “atividades culturais em espaços abertos com capacidade simultânea máxima de 1/3, sem ultrapassar a regra de 4m² por pessoa. Continuam vedadas as atividades culturais em espaços fechados”. Ou seja, cabe a interpretação de que espetáculos já estão liberados, desde que em locais a céu aberto e com público reduzido. Só que não!
O RIO ENCENA entrou em contato com a Secretaria Municipal de Cultura (SMC), e, depois de uma certa insistência, obteve uma curta resposta. Por e-mail, o órgão retornou dizendo que “conforme consta na fase 3, todas as atividades da Cultura neste momento estão acontecendo apenas em forma de drive in”. Entretanto, atividades “drive in”, ou seja, com o público dentro do carro já estão permitidas desde a primeira etapa. Tanto que sessões de cinema nesse esquema já vêm sendo realizadas pela cidade há semanas. A fase 3 então não representa um passo à frente no planejamento de retomada do setor?
E quanto às atividades em lugares abertos, com 1/3 da capacidade e área de 4m² por pessoa? Este não seria um avanço e uma espécie de transição entre o veto total e a permissão para sessões dentro de salas? Até porque a etapa 4, que deve ter início no próximo dia 17, já menciona “atividades culturais em espaços abertos e fechados com capacidade simultânea máxima de 1/3, sem ultrapassar a regra de 4m² por pessoa”.
Nossa reportagem levou o posicionamento ambíguo da SMC à produtora Isabel Gomide, integrante do Mater (Movimento de Artistas de Teatro do Rio) e com experiência em administração de espaços culturais como Espaço Cultural Sérgio Porto, Teatro Glaucio Gill, Teatro Sesc Ginástico e Casa de Cultura da Maré. Para ela, atividades culturais não deveriam estar nem sendo cogitadas neste momento, enquanto os números de casos e mortes de Covid-19 ainda preocupam, seja espaços abertos ou fechados.
— Engraçada essa história do drive in (risos). A verdade é que nenhuma forma de atividade cultural poderia estar acontecendo no momento. Não vejo a menor possibilidade. Atividade cultural implica em contato físico, junção de corpos para exercer uma ação conjunta. O teatro é intrinsecamente coletivo. O circo, a dança… E mesmo que seja um solo, com artista sozinho no palco, existem os técnicos, os funcionários do teatro e o público. Como o público vai entrar num espaço físico, mesmo com 1/3 da capacidade, com entrada e saída no mesmo horário para todo mundo, fila na porta…? Mesmo que tenhamos o esforço de fazer uma peça, quem vai assistir com alguém respirando ao lado? Quem vai confiar que espaços culturais estejam esterilizados a ponto de não haver vírus ali? — questiona.
Para Isabel, a iniciativa de reabrir o setor gradualmente seria um recurso do poder público para não auxiliar trabalhadores da cultura que sofrem com a crise gerada pela pandemia.
— Isso é uma desculpa para o governo não se responsabilizar pela sobrevivência dos artistas. O mundo todo está sustentando seus artistas para ficarem em casa. A ideia é essa para que a pandemia não se espalhe. A gente não pode corroborar com a ideia de que o momento é de reabrir. Isso é uma coisa que vai durar um tempo, e o que sinto é que os governantes estão abrindo para não se responsabilizarem pela grande situação grave em que se encontram trabalhadores da cultura do Rio. Estamos vivendo de ajuda de coletivos da sociedade civil, porque governantes e gestores não fizeram nada para ajudar. O auxílio emergencial do Governo Federal não chegou a todo mundo. A mim não chegou, alegaram que há incompatibilidade com meu nome. A esperança é a Lei Aldir Blanc — torce Isabel, referindo-se ao auxílio emergencial exclusivo para a cultura aprovado nesta semana.
Além da lei na esfera federal, ela torce ainda por outra em âmbito municipal.
— Estamos lutando pela lei SOS Cultura, do vereador Tarcísio Motta (Psol), que também pensa na situação dos artistas do Rio. Muita gente está sendo demitida nos teatros municipais por quebra de contrato da prefeitura com as empresas que terceirizam os funcionários. Então, é um absurdo mais de 70 funcionários demitidos durante a pandemia, técnicos que estavam numa empresa que a prefeitura não pagou, então quebraram o contrato e demitiram todo mundo. Então, esta lei proíbe isso. Porque daqui a pouco a gente volta, e como vai ser? Não vai ter técnico nos teatros? É a cultura colaborando com o desemprego? Uma loucura! A prefeitura demitindo.. Enfim, essa lei também é uma esperança.
Por fim, a produtora encerra ratificando que o momento não é de voltar com o teatro e afirma que a cidade deveria retomar a cultura não de forma gradual em 2020, como prevê a prefeitura, mas, sim, apenas no ano que vem, assim como o grupo que cuida dos teatros da Broadway, que já anunciou que as salas por lá só reabrirão em 2021.
— Até o fim do ano é impossível que a gente exerça qualquer atividade coletiva.